Danilo Barreiros 

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Retrato de corpo inteiro

Jornal Hoje Macau | 5 Out 2010

PREFÁCIO DO LIVRO ‘DANILO – NO TEATRO DA VIDA’

danilo-barreirosA figura de Danilo Barreiros é incontornável na genealogia do território de Macau. Barreiros nasceu em Lisboa e chegou ao território nos anos 30 onde se dedicou ao estudo da cultura chinesa e macaense, com profunda avidez. Daqui partiu para uma carreira multidisciplinar cheio de experiências e de viagens. Formado em Direito já na meia-idade, escreveu e publicou variados romances e ensaios. Uma vida repleta de acontecimentos que vem agora para o conhecimento público através da pena do seu filho, Pedro Barreiros, que lança a biografia do seu pai no centenário do seu nascimento, no próximo dia 11 de Outubro, no Instituto Camões em Lisboa. Deste lado, a obra tem lançamento previsto para o final de Novembro no Instituto Internacional de Macau. Para hoje fica o precioso prefácio escrito por Paulo Franchetti, crítico literário, escritor e professor brasileiro, país por onde Danilo Barreiros passeou também a sua mestria.

por Paulo Franchetti

 

Conheci Danilo Barreiros pessoalmente em 1989. Já o conhecia de nome e de texto havia alguns anos. Mas de poucos textos. Basicamente dos seus livros sobre Wenceslau de Moraes e Camilo Pessanha. Aqueles eram outros tempos, sem internet e sem facilidades de reprodução de livros. A busca e a leitura de um volume podiam até mesmo implicar longas viagens. Os de Danilo só pude encontrar na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, a quatrocentos quilómetros de casa, para onde me deslocara em 1988, com o fim específico de os ler – fato que muito o impressionou, quando lhe contei.
Ainda me lembra perfeitamente o dia em que o conheci. Estava em Lisboa pela primeira vez e por um mês, buscando sofregamente textos sobre e de Camilo Pessanha. Uma tarde apanhei um catálogo telefónico e lá busquei o nome de Danilo Barreiros, sem saber sequer se ainda era vivo ou se residia em Portugal. Telefonei e, para minha surpresa, atendeu sua mulher, D. Henriqueta, ex-aluna de Camilo Pessanha e filha do sinólogo José Vicente Jorge, amigo e conselheiro do poeta nos estudos da literatura chinesa.
No dia seguinte, fiz-lhe a primeira visita, a que se seguiram outras, durante as quais ele me contou longamente (e eu anotei, para memória futura) a sua vida aventurosa e, principalmente, o que sabia de Moraes e de Pessanha – que era muito e tinha um sabor especial narrado pela sua voz.
Impressionou-me, desde o início, não só a vivacidade do seu pensamento e da sua memória, mas também sua generosidade e disposição de dividir, com um estranho, o muito que tinha amealhado ao longo de anos de dedicação. Foi, portanto, com igual dose de assombro e gratidão que, depois de duas ou três visitas, saí uma noite de sua casa carregado com grandes sacolas, nas quais se encontravam os seus livros, junto com grandes cadernos de recortes de jornal sobre Moraes e coisas do Oriente. “Use o que quiser e quando precisar”, disse-me ele.
Além do conhecimento e da enorme afetividade de Danilo, capaz de me incluir na família a partir da descoberta de que minha avó portuguesa era uma Barreira de Trás-os-Montes, na casa onde fui encontrá-lo ao longo de duas semanas me atraía a presença sempre elegante e muito discreta de D. Henriqueta, que me concedeu uma preciosa entrevista sobre os anos em que foi aluna de Pessanha. Além disso, o lugar da minha peregrinação daqueles dias reunia muitos objetos de arte chinesa, que faziam daqueles cômodos um pedaço vivo de Macau – do Macau português que já quase não encontrei quando para lá fui dois anos depois.
Foi nessa época que fui apresentado, em casa de Danilo, a Pedro Barreiros, médico e artista, cuja pintura vim depois a conhecer e admirar muito – especialmente as obras compostas a partir de poemas de Camilo Pessanha. E a quem agora, depois de ler esta obra notável, que não é só um testemunho de dedicação e de amor ao pai e à terra natal, admiro também como escritor.
Da leitura deste romance biográfico, saí com a impressão de que a vida aventurosa e rica de Danilo encontrou aqui o seu narrador ideal. E posso imaginar o quanto ele ficaria feliz ao se ver assim retratado, com tal fidelidade e afeição, pelo filho que lhe herdou os papéis e os livros e, por meio de ampla pesquisa e sistematização de informações, conseguiu compor à volta da vida do pai um vívido quadro da vida portuguesa no começo do século, aquém e além-mar. Especial relevo ganha, naturalmente, a segunda parte do livro, a partir do capítulo XIV, quando começa a aventurosa vida oriental de Danilo Barreiros, pois aí se juntam de modo mais harmônico a experiência do biografado e a vivência do biógrafo que, junto com Graça, sua mulher, é dos maiores conhecedores e dos mais dedicados preservadores da cultura macaense em Portugal.
A melhor homenagem que Pedro Barreiros poderia ter feito ao seu pai era este seu retrato de corpo inteiro, movendo-se contra o pano de fundo de uma época tão próxima e diferente da nossa, ainda capaz de se constituir em palco aberto à aventura e ao exercício triunfante da audácia criativa. Não é trivial juntar com equilíbrio e proveito o gesto afetivo, o olhar para dentro do ambiente familiar, a objetividade histórica e o interesse amplo na cultura geral. Por isso, se lhe é grata a memória do pai por este ato de preservação, também lhe serão gratos os leitores que, por meio deste volume, poderão ter o prazer de travar contato ou conviver de novo, por algumas horas, com essa personagem fascinante que foi – e agora, graças a este livro, continua sendo – Danilo Barreiros.

José Joaquim Monteiro 

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De seu nome José Joaquim Monteiro, este beirão nasceu a 10 de Fevereiro de 1913 no concelho de Tabuaço, mais precisamente na freguesia de Pereiro, tendo sido criado em Estarreja, no distrito de Aveiro.

Verdadeiro andarilho, com apenas 5 anitos emigrou para o Brasil na companhia da avó paterna, tendo por permanecido até aos 11 anos, altura em que regressou a Portugal, tendo, em Lisboa, trabalhado como marceneiro.

Homem simples e sem grandes estudos, era, porém, dotado duma rara sensibilidade e uma enorme vontade de vencer. Nada o desanimava e ao longo da vida evidenciou sempre capacidade para, nas adversidades encontrar, numa lufada de humor, algo de positivo. O cumprimento do serviço militar levou-o a Macau onde chegou em 2 de Novembro de 1937. Era soldado corneteiro da Companhia de Metralhadora, instalada no Quartel de S. Francisco. Daí ser também conhecido pela designação de “o poeta-soldado”.

 

Constituiu família em Macau, tendo regressado a Portugal em 1946/7. As dificuldades da vida e as saudades da nossa pérola do Oriente fizeram que, no início da década de cinquenta, acompanhado da família regressasse a Macau. Aqui foi homem dos sete ofícios. Trabalhou na SOTA, companhia de navegação que assegurava as ligações entre Macau e Timos; depois passou para a Padaria “Sortes”, até que conseguiu ingressar nos Serviços de Educação e tendo sido colocado no Liceu, onde exerceu as funções de contínuo, aposentado-se em 1972.

Dotado de grandes espontaneidade para versejar, deixou-nos vários livros com quadras salpicadas de humor. São de sua autoria os seguintes títulos, todos eles publicados em Macau: “A minha viagem para Macau” (1939), “Histórias dum soldado” (1940), que mereceu quatro edições, “De volta a Macau” (1957), com 2ª edição em 1983, “Macau vista por dentro” (1983) e “Anedotas, contos e lendas” (1989).

A este bom homem, que a 22 de Fevereiro de 1988, viria falecer em Macau, foi concedida quatro anos antes a Medalha de Dedicação.

Francisco de Carvalho e Rêgo

 

Este conimbricence, nascido em 1898 e falecido em Lisboa, em 1960, residiu em Macau durante quatro décadas.

Aí desenvolveu intensa actividade cultural, quer do âmbito da docência, quer da Rádio local, tendo-se afirmado como conferencista de reconhecido mérito, a par de conceituado musicólogo.

Para além de estreito colaborador de autores que se debruçaram sobre a realidade macaense, como o Prof. Charles Boxer e o macaense Jack Braga, deixou-nos várias obras de que destacamos, “Macau”, “Da virtude da mulher chinesa”, “O caso do tesouro do templo de Á-Má” e “Cartas de China”.

Henrique Rodrigues de Senna Fernandes 

No início dos anos cinquenta, regressou à sua amada terra. Exerceu a advocacia e a docência, o que lhe permitiu lidar com centenas de jovens macaenses os quais, dada a sua capacidade nata para comunicar, soube cativar e incentivar, de forma indelével, na prossecução de estudos. Todos os seus antigos alunos o recordam com saudade.

 

Foi professor no Liceu de Macau, à data denominado, “Infante D. Henrique”, assim como na Escola Comercial “Pedro Nolasco”, de que, durante largos anos, foi também Director.

 

Paralelamente esteve ligado a actividades de carácter social, cívico, cultural, desportiva, pelo que não surpreende ter desempenhado, entre outros, os cargos de Presidente do Rotary Club de Macau, da Assembleia Geral da Associação Promotora de Instrução dos Macaenses, da Associação dos Advogados de Macau, Director das Bibliotecas “Nacional de Macau” e da “Sir Robert Ho Tung”, do Centro de Informação e Turismo, etc., tendo sido também membro do Conselho Consultivo do Governador de Macau.

Autor de nomeada, os seus livros têm a particularidade constituírem verdadeiras “fotos-sociais” da comunidade macaense que, com invulgar doçura adoça e que num desenvolto frémito exalta.

Figura grada da Literatura Macaense, são de sua autoria “Nan Van – Contos de Macau” (1979), “Amor e dedinhos de pé”, “Trança feiticeira” e, “Mong-Há” (1998), Sócio Honorário da Casa de Macau, possuia diversas condecorações, quer do Governo de Macau, quer de Portugal, sendo sócio de Academias e instituições similares.

Amante confesso da sétima arte, Senna Fernandes foi dos poucos autores portugueses que se pôde orgulhar de ter dois dos seus livros transpostos para a tela, como já sucedeu aos seus títulos: “A Trança Feiticeira” e “Amor e dedinhos de pé”, adaptados ao cinema, com reconhecido êxito e grande aceitação do público.

Faleceu em Macau, a 4 de Outubro de 2010, vítima de doença prolongada.

 

 

José Inocêncio dos Santos Ferreira

Figura popular da nossa terra, onde viu a luz do dia em 28 de Julho de 1919, Santos Ferreira, vulgo “Adé”, começou por exerceu funções de amanuense na Repartição de Obras Públicas, donde, em 1943, transitou para os Serviços de Saúde e em 1956 para o Liceu de Macau onde, em 1964, se aposentou como Chefe da Secretaria. Após a aposentação assumiu as funções de Secretário da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (STDM), exercendo-as com a maior simplicidade e a par doutras actividades de âmbito desportivo, cultural e filantrópico. O seu maior prazer era estar com os amigos e poder ajudar os mais carenciados.

 

Colaborou em vários jornais, tais como, “O Clarim”, “Notícias de Macau” e “Gazeta Macaense”. O seu primeiro livro surgiu em 1960 e intitula-se “Escandinávia, terra de encantos mil”. Mas Santos Ferreira foi, por excelência, o jocoso poeta do patuá, antigo dialecto falado em Macau que soube cultivou como ninguém. Nas últimas décadas publicou diversos livros, de que nos apraz realçar os seguintes: “Macau Sã Assi” em 1968, “Qui-nova, Chencho” (1974), “Papiá Cristám di Macau” (1978), “Poema di Macau” (1983), “Macau di Tempo Antigo” (1985), “História de Maria e Alferes João” (1987) “Macau, Jardim Abençoado” (1988), “Dóci Papiaçám di Macau” (1990). Em 1992, surgiu o “Poema na Lingu Maquista”, com a chancela da Editora “Livros do Oriente”.

 

Com uma invulgar capacidade cénica, “Adé” que sempre soube congregar à sua volta inúmeros amigos, motivou muitos conterrâneos a relançar o saudoso dialecto macaense. Ele escrevia, ensaiava e era figura central das suas peças teatrais.

Às condecorações com que foi agraciado pela Administração de Macau, junta ele a de Cavaleiro de Tuborg que lhe foi concedida pelo Rei Gustav Adolf da Suécia.

Foi com profundo pesar que a comunidade macaense e não só recebeu a notícia do falecimento do “Adé”, ocorrido em Macau a 24 de Março de 1993.

 

Camilo de Almeida Pessanha

Natural de Coimbra, onde nasceu em 1867 e se bacharelou em Direito, viria a fixar residência em Macau no ano de 1894 e, vitimado pelo ópio, aí falecer de pneumonia pulmonar, aos 59 anos e no primeiro dia de Março de 1926.

Figura inteligente e dotado de invulgar memória, exerceu em Macau a docência no, então, recém-criado (1893) Liceu, a advocacia, com raro brilhantismo, bem como as funções de Conservador do Registo Predial.

 

A sua excentricidade, a par das inconveniências do seu espírito crítico, não raras vezes, provocaram situações embaraçosas, só desculpáveis por ser quem era e, sobretudo, por o considerarem como muito distraído.

 

Ele que é considerado como o maior simbolista da literatura portuguesa, salvo a colaboração no jornal “O Macaense”, bem como no “Jornal Único”, editado, em 1998, por ocasião do quarto centenário dos Descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia, deixou-nos apenas o livro? Clepsidra? editado em 1920, por João de Castro Osório.

Profundamente apaixonado pela cultura chinesa, foi sinólogo respeitado, publicando alguns artigos em prosa como “Esboço crítico da civilização chinesa” e “Ensaio sobre a literatura chinesa”. Possuidor de uma valiosa colecção de arte chinesa, deixou-a em testamento ao Museu Machado de Castro, da sua querida Coimbra.

O Leal Senado de Macau, prestou-lhe público reconhecimento ao realçar a figura ímpar do “professor, jurisconsulto, poeta, jornalista e sinólogo” recordando-o na toponímia da cidade, onde, ainda hoje, perdura a Pei-Sán-lé-Kai, em substituição da, então, existente Rua do Mastro.

Luis Gonzaga Gomes 

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Ilustre macaense, nasceu em 1907 e faleceu na sua terra em 1976.

Personagem plurifacetada, dotada duma enorme sensibilidade para a arte e literatura, postulou, toda a vida, uma simplicidade franciscana. Filólogo por excelência, foi, durante duas décadas, Professor do Ensino Primário e Director da Escola Pedro Nolasco da Silva, assumindo-se, desde muito novo, como um esclarecido conhecedor da língua e da cultura chinesa.

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